segunda-feira, 4 de abril de 2011

BARRAGENS NO RIO URUGUAI*

A questão energética tem ocupado amplos espaços nas pautas sociais nesse último período. Sem dúvida o tema da energia é estratégico e ocupa espaço privilegiado em qualquer debate mais consistente sobre desenvolvimento. Em nossa região, recentemente houveram fortes movimentações em torno do tema dos biocombustíveis e mais recentemente inicia-se, ou urge iniciar, uma discussão mais ampla sobre a instalação de mega represas no Rio Uruguai e suas implicações.

O tema das represas no Rio Uruguai, em seu trecho compartilhado entre Brasil e Argentina, tem sido tratado pelos governos nacionais desses países como uma das pautas prioritárias. Nas instâncias governamentais nacionais amplos estudos estão em curso, sobre a viabilidade dessas obras, porém em nível regional impera a desinformação e a impossibilidade da participação nas discussões relacionadas a configuração e às implicações destes projetos.

Sabe-se que o mapeamento do potencial hidrelétrico da Bacia do Rio Uruguai foi iniciado nos anos de 1960 e 1970. Naquele período, apontava-se a possibilidade de instalação de 25 grandes represas, sendo três delas bi nacionais (Roncador, Garabi e São Pedro). Atualmente as estatais ELETROBRAS (Brasil) e a EBISA (Argentina) realizaram a atualização dos estudos desse potencial, por meio de um novo Inventário Hidrelétrico.

Nessa fase de inventário foram supostas e estudadas diversas possibilidades de localização e de tamanhos de barragens. Depois essas alternativas foram comparadas entre si, com objetivo de verificar as mais viáveis, considerando custos de implantação, benefícios energéticos e impactos socioambientais. Para o desenho dessas distintas alternativas foram utilizados dados secundários, complementados com alguns estudos de campo, considerando informações cartográficas, hidrometeorológicas, energéticas, geológicas e geotécnicas, socioambientais e de possibilidades de uso da água. O estudo compreendeu um trajeto de aproximadamente 725 km do Rio Uruguai, que vai da foz do Rio Peperí-Guaçu até a foz do Rio Quaraí.

Segundo informações fornecidas pela ELETROBRÁS/EBISA, em novembro de 2010, de 24 alternativas estudadas preliminarmente, foram selecionadas duas possibilidades de obras, sendo GARABI, que ficaria a aproximadamente a 6 km rio abaixo da cidade de Garruchos, com nível máximo de água de 89m em relação ao nível do mar e também PANAMBI, a aproximadamente 10 km rio acima de Porto Vera Cruz, com nível de 130m. Juntos, os lagos dessas represas inundariam 96.960 ha e a construção de ambas representaria um custo superior a 5,2 bilhões de dólares. Trata-se portanto de obras gigantescas.

Diante desse quadro muitas perguntas podem e devem ser feitas. Muitas perguntas precisam ser respondidas sobre os impactos econômicos, ambientais e sociais dessas mega obras, como por exemplo: quais os parâmetros e critérios utilizados para a seleção dessas alternativas? E, principalmente, porque é negado às comunidades a possibilidade de opinar nesse processo? Do ponto de vista técnico, possivelmente um tecno-burocrata responderia, preconceituosamente, que se trata de questões técnicas complexas, que as comunidades não teriam condições de compreender, subestimando a inteligência local e tratando-nos como idiotas. Do ponto de vista político, responderiam que as comunidades serão consultadas posteriormente, em outra etapa. Quando, antes de fechar a represa e formar o lago? Depois que as questões centrais estiverem decididas? Que sentido teria, nesse caso, participar apenas para referendar as questões estruturais e poder decidir apenas sobre os detalhes?

Poderiam argumentar que sem energia ninguém vive, uma obviedade que apenas na aparência poderia assumir contornos de argumento irrefutável em favor das barragens. Muitas outras justificativas, como a de que essa é a contribuição da região para o desenvolvimento nacional poderiam ser invocados. Aí sim, nos aproximamos de questões que são preliminares e fundamentais.

Mais do que localização e tamanho, parece-me que precisamos discutir a perspectiva do desenvolvimento que pretendemos e diante disso como essas barragens se inserem, ou não, no contexto regional e nacional.

Precisamos discutir o modelo energético brasileiro, energia para que, para quem e a que custo. Precisamos discutir uma proposta de desenvolvimento para a região missões e celeiro e nesse momento isso implica discutirmos também o modelo energético. Mas isso é tema para outro texto e é preciso espaços e possibilidades para aprofundar esses temas. Seguiremos nas próximas edições.

*Vanderlei Franck Thies

Engenheiro Agrônomo, especialista em Sociologia e em Economia Política. Atualmente é mestrando em Políticas Sociais na Universidade Nacional de Misiones – Argentina e Assessor de Projetos no Sul do Brasil e Norte da Argentina da Heifer Internacional. Email: vftc2@hotmail.com

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